sábado, 12 de dezembro de 2009

Muinheira



Esplendorosas estrelas, sois vós
E apenas vós, que desejo cantar
Plêiades, filhas de Atlas, mostrai
Vossos formosos semblantes a mim


Deixai cair vosso véu de mistério
Enquanto envolvem meus sonhos de noites,
Enchem meus olhos de cores e luzes
Iluminados por alvo luar


Seria Baco, se a graça tivesse
De ser por vós abraçado e cuidado
Mas não é possível, criatura terrestre
Causar encanto nos seres celestes


No firmamento distante a fulgir
Jóias eternas, sem fim no porvir
Causam suspiros em reles mortais
De quem o fim não é previsto demais

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Com outros escritos dando uma trégua, sobra-me um pouco de tempo para retomar a métrica e a prosódia. Aqui, quatro quartas em versos (quase) brancos. Não me preocupei com as rimas desta vez, elas quase que vieram por conta própria - e por isso estão escassas. Pelo contrário, procurei me focar completamente no ritmo, experimentando essa variedade do decassílabo conhecido como "moinheira" (ou "muinheira") ou "gaita galega". O ritmo me foi de tal maneira contagiante que depois de alguns versos ele se impunha sozinho em meu pensamento. Ainda que algumas linhas tenham quebrado um pouco o ritmo por causa de uma tonicidade muito precoce (como em "Plêiades, filhas de Atlas...").
Para não perder o costume, aqui vai a escansão de um dos versos:

Mas | não_é | pos | | vel, | cri_a | tu | ra | ter | res ( tre )
   1          2       3     4   5         6      7     8    9       10

O negrito marca as tônicas principais, na quarta, sétima e (obviamente) décima sílaba. Nesse verso em particular,  temos uma sinalefa na segunda sílaba (na leitura, ficaria algo como "né"); e uma sinérese na sexta sílaba.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Paraíso Perdido





Escrito inspirado em "Paradise Lost", de John Milton

I – A Punição

“Cortem as asas dele!” – ordenou o carrasco.
“As asas com as quais uma vez varou céus –
Ah! Não mais, nunca mais!” – falou tomado de asco
Que escorria da pele e enchia o ar de fel
“E joguem-no por fim, sem asas, do penhasco!”

“Não deixem pluma alguma em tão pérfido réu.
Talhem todas as seis! Seis é sua medida,
Seis o seu julgamento e seis o seu laurel!
Que levará consigo até o fim da vida
E será para sempre o seu algoz cruel.”

Das seis asas privado, o sangue da ferida
Sobre seu corpo nu vertia fogo ardente.
Arrastado ele foi para sua caída
Posto à beira do abismo a contemplar ciente
A sina a si negada e assim sempre temida

“Vê, pela última vez, esta orbe reluzente
Que um dia foi teu lar, tomou teu desamparo –
Ah! Não mais, nunca mais!” – bradou a voz demente
Ao prender os grilhões sem um grande preparo:
“Teu crime a ti atado em teu curso cadente!”

“Não mais terás visão alguma do céu claro
E do brilho estelar – somente escuridão!
Suportarás em falta o anelo que lhe é caro –
Com trevas sobre ti, sem sombra de perdão,
Terás apenas dor em sofrimento raro!”

II – A Réplica

De frente para o abismo enxugou sua face
Dessas gotas de sangue e ódio que o marcavam
Sem mais ter asas que o antigo céu lembrasse
Sem mais visão do céu nos olhos que buscavam
Eis o fim, derradeiro, eis seu fim em seu ápice

"Se seis foi meu início, os seios que tocavam
Seis há de ser também meu fim ao precipício
Seis hão de ser, porém, as pragas aos que ficam!"
Com a língua ferina, aos seus no sacrifício
Feriu com a palavra aqueles que o cercavam

Sob o cerúleo céu, sobre sombra de vício
“Levanta, obscuro véu – diz: de onde tu vieste?
Quando o fim começou? No adorável início?
No orgulho sem perdão? Vê o que tu fizeste!”
As palavras sem cor gritavam seu auspício

“Não respondes, maldito! Oferece-me um teste?
Sou de destino escrito? Ou fiz própria ruína?
De nada importa isto! Estou aqui, a peste!
Nunca me detiveste, e assim tudo termina:
Melhor fulgir na noite a obrar na orbe celeste!”

Um passo a mais, dois, três – finda a carnificina
Cai em pleno vazio, nem som, nem voz, nem nada
Consome toda cor, breu que tudo domina
Mas somem os grilhões e começa a jornada
Em solidão, talvez; sem ordália divina.



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Terminado mais um poema. Nada fácil fazer cinquenta versos alexandrinos, ainda mais com rima. Obviamente que o resultado deixa um pouco a desejar em algumas passagens, certamente exigindo cinzeladas posteriores. Mas por ora, e pela falta de tempo, dou-me por satisfeito.


quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Alexandrinos II - Segunda parte


De frente para o abismo enxugou sua face
Dessas gotas de sangue e ódio que o marcavam
Sem mais ter asas que o antigo céu lembrasse
Sem mais visão do céu nos olhos que buscavam
Eis o fim, derradeiro, eis seu fim em seu ápice

"Se seis foi meu início, os seios que tocavam
Seis há de ser também meu fim ao precipício
Seis hão de ser, porém, as pragas aos que ficam!"
Com a língua ferina, aos seus no sacrifício
Feriu com a palavra aqueles que o cercavam

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Depois de um bom tempo sem retornar a escrita no blog, eis que a releitura me motivou a dar continuidade, ainda que sem promessa, do que estava sendo escrito. Dois quintetos, então, da segunda parte desse poema começado ainda no ano passado.